16/09/2025

Como o hidrogênio verde está redesenhando a indústria química e de fertilizantes no Brasil e no Mundo

O hidrogênio verde está redesenhando a indústria química e de fertilizantes, transformando cadeias produtivas e acelerando a descarbonização. Este surge como o catalisador de uma mudança que vai muito além da troca de insumos energéticos. Trata-se de uma reconfiguração profunda das cadeias produtivas que sustentam o setor químico e, de forma decisiva, a indústria de fertilizantes.

O imperativo da descarbonização industrial

A pressão por descarbonização não é mais retórica. A produção de amônia e fertilizantes responde por cerca de 2,4% das emissões globais de gases de efeito estufa, algo em torno de 2,6 gigatoneladas de carbono por ano. Já a indústria química consome aproximadamente 15% da energia usada pela atividade industrial em economias desenvolvidas. Esse quadro deixa claro que, sem inovação radical, não haverá competitividade futura.

Além da pauta ambiental, há um fator econômico presente. A precificação do carbono e as regulamentações ambientais já moldam mercados e definem padrões de competitividade. As empresas que se anteciparem a essa transição terão vantagem em um ambiente cada vez mais orientado por critérios ESG.

A revolução do hidrogênio verde

O contraste entre hidrogênio cinza e verde é evidente. O primeiro, derivado do gás natural, emite cerca de 10 toneladas de CO₂ por tonelada produzida. O segundo, obtido pela eletrólise da água com energia renovável, elimina essas emissões diretas.

Esse processo pode ser realizado por diferentes tecnologias, como a eletrólise alcalina ou a de membrana de intercâmbio protônico (PEM). Mas o grande salto está na integração com o processo Haber-Bosch, base da produção global de amônia. Manter a eficiência de um método centenário sem gerar carbono abre espaço para uma nova era de fertilizantes.

Avanços recentes, como sistemas de controle de pressão que acompanham a variação de energia renovável, tornam a operação mais viável. Na prática, isso significa plantas industriais que ajustam sua produção conforme a disponibilidade de sol e vento, algo que não era possível até pouco tempo atrás.

Brasil: epicentro da transformação

Poucos países têm as vantagens que o Brasil apresenta. Nossa matriz elétrica é quase 90% renovável, conectada nacionalmente, o que garante escala e estabilidade. Estudos do CNPEM confirmam que é possível ampliar a produção de hidrogênio verde sem comprometer a segurança energética.

Não se trata apenas de projeção. Projetos já estão em execução. A Unigel, em parceria com a Thyssenkrupp Nucera, investe US$ 1,5 bilhão em Camaçari (BA) na primeira grande planta de hidrogênio verde do país. A Atlas Agro segue o mesmo caminho em Uberaba (MG), com aporte de US$ 850 milhões em fertilizantes verdes.

Impacto direto no agronegócio

A dependência brasileira de importações de fertilizantes, que hoje gira em torno de 90%, é um risco estratégico. O conflito na Ucrânia expôs essa vulnerabilidade. A produção local de fertilizantes verdes surge, portanto, não apenas como oportunidade econômica, mas como questão de soberania.

Empresas como a Yara já testam alternativas, produzindo amônia a partir de biometano em Cubatão (SP), com redução de até 75% nas emissões. Esse é um exemplo claro do potencial da bioeconomia quando integrada ao hidrogênio.

Desafios econômicos e logísticos

O custo ainda é o grande ponto sensível. Hoje, o hidrogênio verde varia entre US$ 4 e 12 por quilo, mas deve cair para menos de US$ 2 até 2030. No Brasil, esse patamar pode ser atingido antes, graças ao baixo custo da energia renovável.

A logística, no entanto, segue como barreira relevante. O hidrogênio exige compressão ou liquefação, processos caros e intensivos em energia. Uma saída é a conversão em amônia, mais simples de transportar, mas que eleva o custo final. Também avança a discussão sobre certificações internacionais de “hidrogênio verde”, fundamentais para garantir mercados de exportação.

Conclusão: uma nova era industrial

O mercado global de hidrogênio verde deve saltar de US$ 8,7 bilhões em 2024 para quase US$ 200 bilhões em 2034, crescendo acima de 40% ao ano. O Brasil já soma mais de 100 projetos anunciados, com investimentos superiores a R$ 450 bilhões.

A combinação de custos em queda, regulação favorável e demanda crescente abre uma janela de oportunidade única. Se houver coordenação entre investimentos em tecnologia, infraestrutura e regulação, o Brasil poderá não apenas atender sua própria demanda, mas também se consolidar como exportador de soluções energéticas limpas.

O hidrogênio verde não é mais detalhe na agenda de sustentabilidade. É a chave para reposicionar setores inteiros da economia. E os próximos cinco a dez anos serão decisivos para definir quem liderará essa corrida.

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